31 agosto, 2015

FKA Twigs - M3LL155X (2015)



Nota: 9,1






Fernanda Rodrigues






Sabe aqueles artistas que vão criando nome discretamente? Tu já ouviu o nome deles uma vez, no passado, aí escuta outra vez aqui e ali, vê como sugestão nos recomendados do Last.fm e quando vê PLAU o cara já se tornou uma das novas apostas do cenário musical do ano. Eu me sinto exatamente assim em relação a FKA Twigs. 

Nesse mês, quase exatamente um ano depois do lançamento de seu disco LP1, Twigs já aparece de novo com novidade, mas dessa vez com um EP curtinho de cinco faixas, M3LL155X (lê-se “Melissa”). É nada mais nada menos que mais uma de suas misturas de R&B com eletrônica e tri hop, vozes sussurrantes e feminismo (ainda que seja interessante observar como a voz dela se impõe melhor nesse álbum do que no anterior).

Desde LP1, twigs já deixou bem claro pra todo mundo que não tinha problemas em apresentar temas como sexualidade em suas músicas (aliás, já é uma espécie de característica marcada, querendo ou não). “Two Weeks”, em 2014, já havia traduzido isso muito bem com trechos como “Smoke on your skin to get those pretty eyes rolling/ My thighs are apart for when you're ready to breathe in/ Suck me up, I'm healing for the shit you're dealing”. Apesar de estarmos em pleno século XXI, vale lembrar que falar sobre sexo, especialmente entre mulheres, ainda é um certo tabu (cantar então, ainda mais quando não é através do hip hop ou rap, como faz a Nicki Minaj ou, na maioria das vezes, os homens, é ultrajante). Por isso que twigs é um grande expoente do feminismo musical.

Em M3LL155X, “I’m your doll” é a faixa feminista da vez, tratando tanto do abuso como da objetificação do corpo da mulher, com um vídeo mostrando justamente twigs como uma boneca inflável e com um homem representando o amante agressivo. Apenas o fato de ela já retratar esse tipo de situação em uma música é tipo “ei pessoal, ok. Objetificação feminina existe, certo? Precisamos falar sobre isso sem medo”. É uma das músicas que, junto com “In Time”, tem mais apelo pra um mainstream comercial também, embora FKA Twigs ainda seja uma artista pouco tocada e conhecida na grande mídia.

Além disso, é importante considerar que M3LL155X contou com uma produção em parceria com BOOTS, o mesmo cara que produziu o último álbum autointitulado da Beyoncé. Até dá pra ver nesse EP da twigs algumas semelhanças com “Flawless” e “7/11”, mas nada (absolutamente nada) que a tenha transformado em uma mais uma cópia barata de mais uma diva do pop. Assim como Azealia Banks e Janelle Monáe, twigs tem criado um espaço único pra ela dentro da música. Pra falar a verdade, ela até mesmo tem um pouco da pegada sci-fi que a gente já viu em Monáe (dá uma lida na resenha de The ArchAndroid aqui), mas twigs não perde sua originalidade porque se diferencia com batidas desconexas e quebradas na maioria das músicas, com um ritmo que acelera e diminui a velocidade na mesma proporção quando menos se espera. Acredito que justamente por ser um pop não óbvio e instrospectivo, twigs tenha permanecido (e resistido) por tanto tempo fora do mainstream.

Seja como for, Tahliah Bebrett Barnett, Forerly Know As Twigs (ela teve que adotar esse nome por causa do outro Twigs que já existe na música), através de M3LL155X, deu um tapa na cara da sociedade que ainda a reconhece apenas como a >>namorada do Robert Pattinson<<. Ela não vai ser mais uma mulher que se limita a viver à sombra do cara que anda com ela, twigs é bem mais que isso, o que já deixou bem claro com a personagem Melissa que criou para o álbum. Como ela demonstrou no vídeo contínuo ( praticamente um curta-metragem de pouco mais de 16 minutos com quatro das cinco músicas do álbum) com "In Time" seguida de "Glass and Patron", quando aparece grávida e "dá à luz" a tintas e panos coloridos, twigs é dona da própria criatividade e libertação, sem precisar do empurrãozinho de ninguém pra atingir o sucesso. Ela representa a independência e o esforço que, através das suas músicas, também quer ver nas mulheres que a acompanham.



Onde ouvir: https://www.youtube.com/watch?v=bYU3j-22360

30 agosto, 2015

Beach House - Depression Cherry (2015)

Nota: 6,0







Eduardo Kapp




"Fall back into place"

Porque será que o disco vazou tão cedo? Aliás, porque demorou tanto pra lançar? 3 anos depois do aclamado "Bloom", a dupla eco-reverberada finalmente aparece com um novo álbum. Beach House, pra quem não sabe, é um dos primeiros nomes que surgem no imaginário popular quando se pensa em dream pop atual. Simples, melódico, flutuante e sempre imersivo é o som deles, desde o início, praticamente.

Digo, teve o "Teen Dream" lo-fi e tudo, depois o "Devotion" já foi mais adiante e era mais uma experiência de vida do que qualquer outra coisa. Basicamente, eles (Victoria Legrand e Alex Scally) encontraram um campo de som perfeito (pra eles), sempre naqueles tons dreamy e tudo. Tá, foi genial no início, mas foram poucos os momentos que tentaram sair dessa zona de conforto. O "Bloom" só deu certo por isso: inovaram.

Mas aqui não. Muito pelo contrário. Se tu pedir pra alguém descrever genericamente o som deles os adjetivos vão com toda certeza combinar com o som desse disco. Até nas entrevistas a banda diz que resolveu ficar de boas e só fazer o que fazem normalmente e isso já era o bastante. Bom, o som genérico deles é legal, mas até que ponto isso te mantém ligado pelos seus 40 minutos de duração?

"Sparks" é tão boa, tão genial, tão intensa. Eu só consigo pensar nessa música quando penso nesse álbum. É tipo, Sparks e o resto. Todas as outras são lado-B se comparadas. Foi o primeiro e obviamente o single que lidera a promoção do disco. Combina não só os clássicos sons deles como uma pegada bem shoegaze. Algo como Slowdive meets Cocteau Twins. Definitivamente uma das melhores coisas que eles fizeram até então. Pulsante, bem produzida, tudo no lugar. As coisas vão acontecendo e aí fica tudo escuro e tu não sabe onde tá. Como uma faísca, só que ao contrário.

Não dá pra deixar de falar de "Space Song" ou "Levitation", que por um belo acaso estão logo antes e logo depois de "Sparks". Também algumas das melhores coisas que a banda fez em tempos. Lembra bastante o Teen Dream, na real. Ao menos, ficam na cabeça, são interessantes e tudo. Eis o grande problema: além desses sons, não lembro de nada do resto.

Longe de ser ruim ou algo assim, só que é completamente descartável. Tu fica perdido e se perguntando se a próxima música vai ser melhor. Mais um disco em vão. Não sei ao certo, mas pelo título acho que todo mundo esperava mais. Prefiro pensar no "Depression Cherry" como 3 grandes singles e alguns lado-B bons(inhos), afinal é isso que me faz querer ouvir outra vez.

Thiago Ramil - Leve Embora (2015)

Matheus Donay












Não sabia que Thiago, da árvore genealógica mais musical do Brasil (família Ramil), lançaria um álbum até ver pelas webs um link com o seu primeiro single. Esperei o álbum com um pouco de ansiedade, apesar de desconhecer a carreira dele. Um sentido instintivo até.

Desde a gestação do disco, fantasiei como este poderia ser. Sei lá, um caderninho de inquietações e/ou pensamentos aleatórios do compositor, gosto de intimismo quando não se torna ego. Quando isso rola, parece que se a gente largar o disco físico numa balança ela mal vai reagir, tamanha leveza. Algo que você sente em todos detalhes: a lomografia da capa, o nome das músicas, o encarte, enfim.

Leve também, a voz de Thiago me passa uma mistura de maturidade/juventude.Voz: um instrumento muito importante neste disco, que deixa vácuos em alguns momentos e mira todos feixes de luz pra salientar somente a ela. O single Desculpa foi a primeira demonstração, onde apenas alguns ruídos do baixo acompanham o vocal. Aliás, é nessa música que ele reservaria seu lugar no inferno se estivéssemos na idade média, tamanho ceticismo na letra.

O disco é moderno em vários aspectos. Um deles, é a relativa facilidade de se gravar um debut álbum numa qualidade padrão de produção. Seja por financiamento ou edital (o caso deste), as portas têm sido abertas com pequenos ventos. Outra coisa que notifiquei, que pode ser impressão minha ou não, é que raramente um artista tem lançado disco solo sem alguma parceria. E as parcerias costumam fazer as melhores músicas. Em Leite e Nata, um ping-pong de voz masculina/feminina (me escapa o nome de quem canta, perdona-me) cantam uma letra cheia de trocadilhos e de uma poética interessante.

No geral, o violão é quem mais dá a cara a tapa no disco. Entre uma música e outra você ouve algum violino, uma variedade de intrumentos de percussão, ares de MPB e em Dizharmonia uma samplezinha de Strawberry Fields Forever (daquele famoso quarteto inglês) que te pega despreparado.

O Rio Grande do Sul nos últimos anos tem sido um polo de formação de artisas jovens e independentes. Uma safra que aumenta a oferta pra uma demanda infinita que é a de gente pra ouvir. Nesse meio, Leve Embora é um disco pra ouvir com as janelas abertas com o sol rachando em alguma delas. Às vezes a estética do ambiente influencia nas canções. Tá dado o recado.

09 agosto, 2015

Júpiter Maçã @Theatro Treze de Maio

Foto: Ana Bittencourt / Rádio On The Rocks
Na última semana matutava quase que diariamente com alguns amigos sobre qual Júpiter veríamos na nossa frente neste show. Seria aquele pulsante e elétrico ou aquele com as pilhas fracas e mórbido? Dentre as várias facetas que já conhecíamos, o fato é que a espera pra ver ele foi muito grande. 

As cortinas se abriram e Júpiter tocava durante o show uma verdadeira salada mista no que tange as épocas de sua carreia. O novo, o já nem tão recente, o velho e o velho remodelado. Quando falo em novo me refiro à promessa de novo álbum que já se especula e que tudo leva a crer que terá uma roupagem mais folk. Se tiver curiosidade, procure por 'Constantine Empire', que leva a melodia de uma música sua que nunca foi gravada oficialmente: Doenças de Alma. 

Modern Kid, Um lugar do caralho, As tortas e as cucas, Beatle George...Todas presentes no set. Quanto à escolha do repertório não há muito o que se questionar, talvez pudesse se reivindicar algo como a Marchinha Psicótica ou Miss Lexotan, que ficaram de fora.

Mas o grande ponto da noite - infelizmente - não foram os clássicos da renomada carreira de Flávio Basso. Foi quando eu e meus amigos descobrimos qual Júpiter faria a apresentação que pairou sobre o teatro uma energia de desconfiança e lamento. Visivelmente debilitado pelo álcool, o cara via na sua frente (quando não virava de costas pro público) espectadores que com certeza tinham enorme carinho, respeito e admiração por tudo o que a sua carreira já havia proporcionado.

Foto: Atílio Alencar


"Quem compra ticket para Jupiter Apple, compra ticket para um filme de terror!" Frase expressa pelo próprio.

Por vezes o show se tranformava em comédia stand-up, momentos em que ele assumia o microfone para tornar público seus contos eróticos e coisas pornográficas non-sense. Longe de qualquer moralismo, mas o uso de palavrões fora de contexto foi demasiado e não faltaram expressões e discursos que imprimissem opressão às mulheres. Júpiter Maçã mais parecia uma criança cheia de hormônios e mal educada. Apesar de tudo, recebia aplausos meio constrangidos e risadas que justificam o "rir pra não chorar".

O show, que pontualmente começou às 20 horas, teve um repertório de 13 músicas e duração de 1h e 30min. A justificativa pra um show tão demorado pro número de músicas em questão se dá pela imprevisibilidade do Júpiter, que fazia com que uma música de 4 minutos durasse 8. Errava os tempos de começar a cantar, esquecia letras, não tinha noção de espaço apesar do palco grande e até mesmo o cabo da sua guitarra era uma armadilha, já que se enrolava a todo momento. A banda, que não deixava a peteca cair, chegava a ficar minutos tocando à espera de que Flávio Basso resolvesse cantar, o que - convenhamos - cansa.

Por tudo que aconteceu, não há como não deixar uma menção honrosa à banda que acompanhava o músico e aos dois roadies. Era um show que não dava brecha pra distração. Os olhos de todos eram voltados para o man, que dava muito trabalho, chegando a sumir do palco por vários minutos. Aí, triste/brilhantemente o sintetizador assume a voz que nos deixou órfão naquele tempo de espera pra cantar artificialmente as sílabas de Essência Interior. Ainda acho que o ambiente contribuía pra frustração. Pois ora, se tem duas coisas que repudio assiduamente assistir sentado, elas são: jogo de futebol e show de rock. O teatro não é o habitat natural do Júpiter Maçã.

Depois do show, conversando sobre as impressões, é unânime o sentimento amargo. Obviamente, é um momento nobre e raro ver ao vivo canções tão clássicas como as que eram apresentadas, mas aquela coceira na cabeça, a pulga atrás da orelha, essa não tinha como evitar. 

Lembro-me de ter ficado meio triste no início do ano, quando anunciaram que Júpiter estava se despedindo dos palcos com dois shows acústicos em Porto Alegre, dos quais não poderia ir. Depois da apresentação de ontem, fico pensando se não teria sido melhor para o próprio Júpiter ter tirado um tempo pra si ficando longe dos palcos. A obra dele está lá registrada, intocável, ninguém apaga a história muito menos desconstrói o que significa o Júpiter e sua importância na música gaúcha/brasileira. Só que o que foi visto foi melancólico, jamais havia sentido algo ruim ao sair de um show. 

É como entrar num carro com o motorista embriagado e torcer pra que não ocorra nenhuma fatalidade no percurso e chegue em casa bem. Aonde foi parar aquele menino que queria cantar como o beatle George? Júpiter precisa de ajuda, pra ontem - literalmente.

Matheus Donay 

17 julho, 2015

Pedro Pastoriz - 1 (2015)







Matheus Donay






Geralmente quando paro pra ouvir um álbum do início ao fim passam muitos pensamentos pela cabeça. Obviamente, a maioria deles pré-moldados, ainda não lapidados e muitas vezes precipitados. Tive uma sensação boa-estranha ao ouvir o "1", disco do Pedro Pastoriz. Fui com uma boa expectativa, impulsionado pela banda que ele faz parte, o Mustache & Os Apaches.

Gosto das culturas regionais e como elas estampam bem ‘seu território’ nos acordes, letras e na pura essência. Por outro lado, acho muito interessante quando alguém que não é do habitat abraça um gênero longínquo. Acho que o brasileiro Pastoriz tirou de letra interpretar o folk raiz americano, um pouco diferente daquele folk mais pop do Mustache. Aliás, muita gente brasileira conhece o folk, mas desconheço artistas do ramo (se alguém souber, por favor, me indique).

Para os apreciadores do futebol: sabe quando tu começa a lembrar/imaginar os velhos cabeludos de chuteira preta e bigode? Pois é. Esse é o feeling do 1. Gravado em 1 TAKE em FUCKING 40 MINUTOS, direto no vinil. Romantismo puro. Reza a lenda que o cara TIROU O CABAÇO do Brasil nesse tipo de gravação. A grosso modo, já imaginou deixar teu celular captando som, pegar um violão e uma gaita e gravar um disco? Mahomenos isso que rolou.

Ainda essa semana conversava com o outro rapaz que escreve neste blog sobre alguns folks dos anos 40s, os métodos gravação e a vibe toda do cenário. Curiosamente na mesma semana sai esse álbum, com características muito marcadas da época. Desde o simplório instrumental, o jeito de cantar e a qualidade do som. Nesse vídeo dá pra sacar o quão roots é a coisa, https://vimeo.com/125068399. Um disco que sinceramente poderia se chamar “Ao vivo no estúdio”.

A gravação crua desse tipo nos permite apreciar as minúcias que só a simplicidade nos oferece, longe de qualquer trabalho de mixagem, efeitos, pedais e toda essa parafernalha. Tipo quando o cara resolve aumentar a voz e vazam uns ecos ambientes. Rola isso bastante em Figurantes do Showbizz. Ou então em Sheik, onde rolam aqueles barulhos de quem bate no microfone ou coisa do tipo.

O cara falou que vai sair tocar na rua, cafés, brechós e onde seja que role um espacinho. A começar pela Europa. Parece que rola toda uma estética em volta, com cenário e tals. As letras, que foram escritas nos States, também entram nessa. Uma roupagem clássica do folk.

Sinceridade é o ponto forte do trabalho. As letras, as palhetadas, o take NUDE. Raras as vezes em que senti proximidade com o artista, mesmo que seja um sentimento abstrato. Se a intenção era tocar o ouvinte por este viés, acho que o cara teve êxito.

Onde ouvir: https://soundcloud.com/pedropastoriz/sets/pedro-pastoriz-1

16 julho, 2015

Tame Impala - Currents (2015)

Nota: 6,5







Eduardo Kapp





Meu indicativo de popularidade absurda de uma banda é quando o som deles chega, de alguma forma, aos ouvidos da minha mãe (eu sei que tu não tem tempo de ouvir mais músicas e tudo, não se ofenda ok mãe). Pois então. Ela, assim como vocês, conhece e aprecia o hit-single-psych-pop-bliss "Feels Like We Only Go Backwards". Essa música, parte do também enorme e absurdamente bom "Lonerism" levou o Tame Impala aos headlines de vários festivais importantes. Literalmente, eles passaram os últimos 3 anos em tour contínua, sempre nos maiores e melhores lugares.

No início underground, fizeram o nome com seu som meio garage-stoner-psych rock ("Tame Impala EP"), evoluindo pra algo mais atmosférico e espacial no primeiro full-lenght "Innerspeaker". Até aí, era um "revival-moderno" que tinha um público alvo mais limitado e tudo. Se o Kevin continuasse só com isso, já teria um lugar garantido tanto na crítica quanto nos circuitos de shows.

Só que: ele seguiu mudando. Em 2012 é lançado o segundo LP, "Lonerism". Genial, popular, inovador. Realmente colocou o Tame Impala no topo. Gerou uma porção de bandas nessa mesma direção, rendeu um pesadelo pra vários grupos que "soam como Tame Impala". Bom, desde 2012 Kevin foi lentamente alterando seu estilo, fazendo algumas jams mais eletrônicas e menos trabalhos centrados na guitarra.

Aí que começa essa aproximação cada vez mais pop. Na verdade, o próprio Lonerism, embora não "pareça", é supostamente inspirado em coisas como.. Britney Spears. Entre isso e aquilo, Kevin postou uma porção de covers (desde Michael Jackson até OutKast) e rolou um EP com o Flaming Lips, um tocando as músicas do outro.

As entrevistas só repetiam isso: "Kevin diz estar ouvindo mais pop" "Kevin não consegue mais controlar a vontade de fazer pop" etc etc. Pra coroar, veio a participação no "Uptown Special", do Mark Ronson. E pra deixar bem claro: nada disso foi ruim. Muito pelo contrário. Fui ficando cada vez mais fascinado pela ideia de um futuro disco super-edgy-pop-psicodélico. Quem sabe íamos nos deparar com o próximo Pet Sounds? Foi por essa época que o "Currents" finalmente teve uma data mais ou menos prevista pra lançamento. O hype já tava crescendo exponencialmente.

"Let It Happen": a odisseia pulsante entre loops e viradas de knob, sintetizadores gigantescos, analógicos, a pista que todos os fãs precisavam pra colocar ainda mais fé nesse disco. O mesmo vale pras outras faixas que foram lançadas pela mesma época. "Eventually", "Disciples" e "'Cause I'm A Man". Todas apontavam pra uma mesma direção: disco, groovy-funk, pop (e quiçá umas gotas de vaporwave). No início fiquei meio assim, não parecia ser ~tudo isso~, meio abaixo do potencial esperado e tal. De qualquer forma, "Eventually" e "Let It Happen" acabaram melhorando muito depois de alguns dias, são definitivamente algumas das melhores músicas feitas por Parker até então.

Quando finalmente consegui ouvir o disco, fiquei todo errado. "Nangs", que tinha aparecido como trilha pra um vídeo-prévia do disco tava lá como música. Qual é. 1 minuto e 48 segundos da música que praticamente todo mundo ficou querendo mais. Depois passar os primeiros 30 segundos achando que eu tinha colocado "Everyone Wants To Rule The World" do Tears for Fears pra tocar, quando na verdade era a faixa 3 "The Moment". Não foi algo exatamente agradável.

Mas fora isso, a primeira metade do disco é quase impecável. "Yes I'm Changing" diz muito sobre as intenções do Kevin no disco, que praticamente tenta mudar a visão sobre álbuns "de rock". Como ele disse, tenta convencer prog-70s-heads que dá pra unir o som deles com alguns synths dos anos 80. A produção tá muito melhor. No duro, a confusão sonora de algumas coisas dos discos anteriores não passa nem perto. O perfeccionismo nas layers chegou a níveis inimagináveis. Tá tudo no lugar, certinho, cuidadosamente pensado. A temática toda das letras é meio break-up songs. Deve ter algo a ver com o fim do relacionamento com a Melody Prochet (da Melody's Echo Chamber). Mas isso de uma forma bem 80's, não tão "abstrata" e aérea quanto nos discos anteriores. "[..] and gazing out the window, as I ascend into the sky" em 2010 agora é "[..]she was holding hands with Trevor, not the greatest feeling ever" (ok eu sei que foi uma comparação meio nonsense mas deu pra sacar o ponto)

O problema, no entanto, não é a mudança do estilo, mas o disco como um conjunto. Enquanto tem essas baladas-espaciais-melancólicas geniais, ou esses sons mais pulsantes e explosivos, tem umas músicas completamente desnecessárias só pra tomar espaço. Os vocais em algumas músicas parecem vazios e sem muita vontade. Parece que, em algum ponto da história toda, o Kevin se transformou numa mera máquina de fazer músicas. Acho que ele vê seu "Eu" produtor separado do Eu artista. Bizarro.

Tem essa "Past Life", com uma voz grave e modificada, mais te deixando desconfortável e confuso do que "intrigado". Aí no single "'Cause I'm A Man" é a mesma coisa óbvia e previsível a música toda. Depois daí, sinceramente, eu só consigo lembrar daquela linha "does it really fucking matter?" em "Love/Paranoia" (que mesmo assim só falta alguém chegar e falar "d-d-drop the bass" pra completar a brincadeira). As outras, nem fazem falta ou te deixam afim de ouvir de novo.

Ou seja, tem essas músicas geniais, o Kevin tá tomando riscos, não tá na zona de conforto, é a melhor direção que se pode tomar artisticamente: seguir se desafiando e tudo. Isso nos mostra que o Tame Impala é ainda maior, se reinventando e explorando. Mas aparentemente ele não conseguiu tornar isso agradável no todo, acabando com uma coisa meio repetitiva, fraca e previsível. Vale muito até a metade (com ressalvas), depois é uma combinação de tristeza e tédio.

Onde ouvir: https://www.youtube.com/watch?v=gq_qFBJkOI4

15 julho, 2015

Florence + The Machine - How Big, How Blue, How Beautiful (2015)



Nota: 7,9




Fernanda Rodrigues







Sempre que eu vou ouvir alguma música de Florence + The Machine eu me lembro da apresentação que eles fizeram no Rock in Rio 2013 e de como eu fiquei muito irritada por ela não cantar e ficar correndo de um lado pro outro no palco, como se estivesse recebendo alguma entidade (embora, convenhamos, Lorde ainda faça isso nas suas apresentações melhor do que Florence. Mas enfim, se você quiser dar uma olhada, aqui tem um vídeo em que ela até canta, mas aposta uma corridinha consigo mesma pra lá e pra cá no palco, como se a emoção demasiada que estivesse sentindo naquele momento fosse a real culpada de ela precisar extravasar em alguns passos). Em suma, onde eu quero chegar é nisso: Florence Welch sempre quer colocar alma, espírito, sentimentos, loucura, confusão – sei lá quais outros adjetivos usar, mas é no sentido de querer desestruturar aqueles que, porventura, venham a ter a ousadia de ouvir seus álbuns. 

Depois de um jejum de quatro aninhos sem novas produções, a gente já consegue ver a novidade logo na primeira faixa, “Ship To Wreck”. Ao contrário da maioria das faixas da banda (principalmente as escolhidas para abertura dos outros dois álbuns, vide “Only It For A Night” e “Dog Days Are Over”), “Ship To Wreck” já começa a todo o vapor, não evoluindo aos poucos como era de costume (até mesmo “Drumming Song”, em Lungs, que é uma das mais agitadas da banda, não começou tão agitada quanto).

Por outro lado, se formos falar em semelhanças, elas também existem e mesmo assim não prejudicaram o álbum. Como era de se esperar, a marca principal continua sendo os agudos de Florence – a sua voz parece ter sido feita pra interpretar as músicas de How Big, How Blue, How Beautiful. Ela consegue transformar tanto tragédia quanto romance nas coisas mais lindas do mundo. É só olhar pra “Various Saints and Storms”: a letra toda é meio depressiva e destinada pra quem tá bem triste™ (“I know you’re bleeding, but you’ll be ok// Hold on to your heart, you’ll keep it safe// Hold on to your heart, don’t give it away”), mas ainda assim, na voz de Florence, a tristeza parece uma coisa tão sublime de se sentir que dá até vontade de ter uma autopiedade pelos quatro minutos e pouquinho da música.

A faixa que deu nome ao álbum, por sua vez, tem algo que lembra o som de “Cosmic Love”, lá de Lungs (novamente), com uma entonação meio divina-barra-espiritual-barra-transcendente. A religião vem agora na forma de “Delilah” (a Dalila de Dalila e Sansão mesmo) e “St. Jude”, como até Deus já apareceu em “You’ve Got The Love” em outro momento. Aliás, “St. Jude” é a música com o instrumental menos produzido, mais simplesinha, como se fosse uma oração humilde à santa das causas perdidas para Florence conseguir deixar um amor pra trás, ainda que ela esteja se lamentando.

Todas as músicas, no geral, não fogem muito desse tom intimista e confessional, para falar a verdade, como se estivéssemos lendo o diário de alguém (um alguém muito depressivo, diga-se de passagem, mas que vem tentando melhorar). HB HB HB é mais um álbum que reflete o mundo conturbado e caótico que é o interior da cabeça de Florence, sendo muito bem sustentado pelo instrumental da banda (destaque para as guitarras em “What Kind Of Men” que fizeram da música uma das mais intensas) que consegue acompanhar o ritmo da vocalista, o qual, convenhamos, não é nada estável. Florence também não se importou em deixar a indireta de que o "Man" da faixa dois provavelmente é seu namorado James Nebitt, com quem a relação sempre foi de vai-e-vem, ou de falar sobre como as pílulas (citadas tanto na música de abertura quanto em “Delilah”) e a bebida foram (talvez ainda sejam) suas companheiras na hora que ela sente seu mundo desabar sobre seus sonhos. E isso deixa bem claro que esse último álbum tem um pé mais bem fixado na realidade do que seus antecessores. Lungs e Ceremonials eram mais etéreos e sombrios, acima do mundo material.

O sofrimento de Florence (apesar de ser aparentemente maior do que o de qualquer outra pessoa) aparece agora de uma forma mais real, com um uso mais "convencional" da guitarra, não constantemente atrás de atingir um ápice mítico, como nos outros álbuns. Pra concluir: Florence + The Machine desbloqueou, através de How Big, How Blue, How Beautiful, o nível 3 da carreira (geralmente o momento de queda de muita bandas) e passou para a próxima etapa.

May the odds be ever in their favor.



Onde ouvir: http://tracklist.com.br/ouca-na-integra-how-big-how-blue-how-beautiful-novo-album-do-florence-the-machine/29971

11 julho, 2015

Unknown Mortal Orchestra - Multi-Love (2015)

Nota: 7,4







Eduardo Kapp





Fico tentando entender como funciona uma mente humana que compõe as melodias mais pop em meio a tanto isolamento e solidão. Quero dizer, como é que quase 2 anos trancado numa garagem podem te fazer ter qualquer ideia musical que não soe como algo absurdo? Bom, não podem. As influências tavam lá, o contexto e a vontade também, mas aparentemente isso não foi o bastante pra tirar uma das características principais do Neo-Zelandês Ruban Nielson: O som exótico e estranho.

Na verdade, nos últimos lançamentos não foi muito diferente. Tem várias ideias pop que, caso produzidas de forma diferente poderiam ser, sei lá, um baita hit ou algo que o valha. Secret Xtians, Little Blue House, How Can U Luv Me e tantas outras. Felizmente ou não, Ruban prefere torcer essas ideias, destruir o caminho linear e acessível, encher de camadas e texturas, tocar uns solos doidos sem palheta, deixar tudo soando meio explosivo e raspy.

A temática dominante aqui é um bocado óbvia. O nome do disco e tudo... Enfim, as linhas celebram uma curta experiência de Poliamor que o Ruban e sua esposa tiveram com uma terceira pessoa. "Multi Love has got me on my knees, we were one, and then we got three". Embora não seja muito aparente, Ruban é pai de 2 filhos e é casado e tudo, então dá pra imaginar o quão doido e intenso deve ter sido essa experiência.

Não sei, tem toda essa inclinação pra algo mais groovy, funk-y e essa coisa toda. Gostei bastante dessa direção, mas por alguma razão, as músicas parecem não chegar a lugar nenhum. "Like Acid Rain" é explosiva, tem várias partes boas, mas parece algo completamente sem razão de existir. É o famigerado "tá, eaí?" que tu sente depois de ouvir. Dá pra sentir isso em quase todas as músicas, na verdade. Poucas se salvam.

Não dá pra deixar de dizer, no entanto, que a produção continua muito criativa. A qualquer instante, são várias camadas cuidadosamente organizadas. Extremamente exótico. "Can't Keep Checking My Phone" te leva pra outros mundos, definitivamente. Tem muita coisa acontecendo ao mesmo tempo. De novo, isso parece ser a melhor e a pior coisa por aqui. Se nessa faixa esse é o ponto positivo, em outras como "Stage or Screen" parece meio.. overproduced (vide aquela quebra de continuidade sem noção ali pelo finalzinho da música). Entende?

Bom, mesmo tendo essas melodias confusas, felizes e tudo (algo como um álbum do Prince produzido pelo Wayne Coyne), as letras são muito intensas. Muito mais que os anteriores, aparentemente. O self-titled e o "II" soam mais como alguém divagando sobre sentimentos estranhos e distantes, enquanto no Multi-Love é muito mais concreto e direto. O próprio Ruban comentou em várias entrevistas que essa relação toda foi praticamente a coisa mais marcante de toda sua vida.

E eu gosto bastante dessas coisas estranhas e experimentais. O problema é que o Ruban não soube tornar essas experimentações lá tão interessantes como tinha conseguido anteriormente. No duro, as melhores partes da coisa toda são onde, aparentemente, ninguém tá tentando soar como nada e só tá deixando acontecer: leia-se "Necessary Evil" (com a parte dos metais sendo tocada pelo próprio pai do Ruban) e principalmente "Puzzles". "Puzzles" é definitivamente o ponto alto do disco. Parece algo com vida própria, que nem deveria fazer parte desse disco. E claro: os teclados tipo-supertramp da faixa título, que é genial por si só.

Onde ouvir: https://www.youtube.com/watch?v=ByYvTra8zWw&list=PLAnADJJTXDSq45D-a4pv_65CwIEErpXsf (só parte das músicas estão no youtube :/ )

07 julho, 2015

Esteban - Saca La Muerte De Tu Vida (2015)






Por Matheus Donay







Saca a morte da tua vida.

O comentário que circulava entre os amigos mais ansiosos pelo lançamento do álbum era massivamente um. Um desejo, aliás: tomara que o cara não abandone aquela melancolia que fez a gente gostar afu o primeiro álbum. Se o debut Adiós, Esteban! era uma espécie de Chinese Democracy do cara, até que a burocracia pra lançar o SLMDTV foi tranquila.

A ideia que eu tenho é que o Tavares, inteligentemente eu diria, se apoia muito na estética em seus trabalhos. Olhe para o nome do projeto, o nome dos discos (em espanhol) e a sua imagem de quem faz música latina e pampeana (o que não é mentira, mas não abraço como verdade integral). O cara nunca poupa esforços pra dizer que "Minhas influências são Fito, Charly García..." enfim, os ícones. 

Duas músicas levam a pecha de Chacarera no álbum (Chacarera de Saudade e Chacarera 2). Aliás, duas versões de uma mesma música (a segunda é cantada pelo Pirisca Grecco, cantor tradicionalista gaúcho). Outra leva no nome Tango (Tango Novo), e curiosamente nenhuma das citadas defende com fidelidade o gênero da referência. Fica a brecha pra corneta: LA COPA SE MIRA Y NO SE TOCA,TABARES. Fora essas coisinhas distorcidas de folclore eu arrisco dizer que são as melhores do disco, heheh.

Libertad, libertad! Uma coisa que ficava bem perceptível em entrevistas era que o que incomodava muito a carreira do cara era o mercado. Gravadora, liberdade pra criar, aquele mala do Rick Bonadio se apropriando do trabalho alheio, uma penca de entraves. Parece que desta vez a coisa fluiu, liberdade total pra criar e tudo más. Ficou meio eclético até, quando se encontram canções de tendência regionalista e outras que lembram os tempos da Abril, sua primeira banda.

Sempre achei a lírica do Esteban muito apurada, cheia de sacadas, joguinho de fonemas e tal. O disco conta com isso, mas o que me chama atenção é a letra de Me Sinto Humano. Me lembra muito meus poemas de ensino médio heheheh. "Me sinto humano / Quando tenho medo e fico congelado / Quando estou feliz por estar alienado / Quando o Grêmio toma um gol do Colorado / A dez minutos do final". Com direito a narração de gol do clube del pueblo no final.

Pra não perder o trem das ALEATORIEDADES do álbum, um dos ápices pra mim é na transição pra voz da Tay Galega em Tango Novo, quando rola um teclado que se um pouco mais trabalho vira uma psicodelia COGUMÉLICA do Youth Lagoon

Em time que tá ganhando não se mexe, e não são poucas as músicas do Saca La Muerte de Tu Vida que lembram as canções do Adiós. Janeiro, por exemplo, tem linhas de acordeon e guitarras bem leves, acompanhadas de um vocal arrastado y doloroso. É o mesmo esquema de Eu sei, você esqueceu, faixa do primeiro disco.

Sclmdtv é o sofrimento do homem de alpargata. É um embrulho de medicamentos pra dor de cabeça, drogas lícitas e uma espécie trovadorismo que não é xucro, mas bonito. Segue a linha do primeiro álbum, não decepciona, se arrasta às vezes, mas prende. O resto você descobre sozinho, ouvindo aqui: https://www.youtube.com/watch?v=y5zPDSalzt8

12 junho, 2015

American Football - American Football (1999)









Michel Peixoto



But that's life, so social..

O American Football com certeza é uma das bandas mais influentes do emo (e com menor vida também), mas pra falar disso, é necessário voltar um pouco no tempo. Pra começo de história, Mike Kinsella, vocalista e guitarrista da banda, é uma das mais importantes figuras da chamada "segunda geração" do emo. No fim da década de oitenta, ele e seu irmão Tim Kinsella, influenciados por bandas como Rites Of Spring, Embrace e algumas características de outros estilos musicais como o jazz, formaram o Cap'n Jazz. A banda gravou alguns singles, um ep e um álbum antes de seu fim e depois cada integrante criou seu próprio projeto, sendo o de Mike Kinsella o American Football. O Cap'n Jazz, por ter dado vida a muitas outras bandas e a tantas diferenças sonoras que passaram a existir dentro da cena, tem um papel tão importante quanto ao que caras como Ian MacKaye e Guy Picciotto tiveram no começo de tudo.

Relacionamentos frustrados, incertezas, despedidas e reflexões em atitudes pessoais são o prato principal das letras do disco. Verdade seja dita, Mike Kinsella é um contador de histórias, isso é notável tanto no seu trabalho com o American Football quanto no seu projeto solo, o Owen, onde suas letras aparecem sempre com muitas histórias/experiências pessoais e citações de seus autores e obras literárias favoritas.

O álbum começa já com a polirrítimica "Never Meant", que além de ser a música mais marcante da banda, é um ótimo jeito de começar, pois é capaz de mostrar o que vamos encontrar durante o resto do álbum: dinâmicas, afinações nada convencionais, o timbre de voz agudo que o Mike Kinsella tinha na época com seus vinte e dois anos e todas as ambientações/atmosferas e situações que esse álbum é capaz de te colocar.

"I'm thinking about...leaving" é o primeiro verso de "The Summer Ends", uma das músicas mais tristes deste álbum, onde desde a primeira nota da guitarra até o último verso te ambientam em um cenário de despedida. Ao ouvir essa música pela primeira vez, achei os versos bem bobos e simples. Só se tornou impactante de verdade depois de escutar mais algumas vezes e ver que cada elemento presente (as guitarras que ficam indo e vindo em algumas partes, os versos e até mesmo o trompete da introdução) de alguma maneira me ambienta na situação da música.

"Honestly" é uma das minhas favoritas do disco e já entra com um riff marcante que se estende durante a primeira parte da música. Na segunda parte, a banda faz uma progressão instrumental em cima de uma variação do acorde aberto da afinação e ao longo dela, mais guitarras vão aparecendo e se somando a bateria que vai acompanhando e fazendo algumas mudanças até o final onde aos poucos todos os instrumentos vão se despedindo em um fade out.

Depois vem "For Sure", que logo de cara, tem um trompete que se junta ao baixo e faz com que a música navegue dentro da sua tonalidade enquanto a guitarra faz algumas variações do riff principal até o final. É uma das mais curtas e diretas do disco. "You Know I Should Be Leaving Soon" pra mim sempre vai ser uma música estranha, interessante, e ao mesmo tempo de transição. Por algum motivo que eu nunca vou entender, essa música me deixa um pouco apreensivo, com dúvida sobre alguma coisa que esteja acontecendo ou que vai acontecer. A bateria com a levada jazz é o ponto forte da música, que muda um pouco dali e quebra um pouco de acolá. Se fosse pra dividir este disco em duas partes, seria depois dessa música, é a partir do final dela que as coisas se agitam um pouco.

"But The Regrets Are Killing Me" é um pouco diferente das demais do disco por não ter partes com tanta progressão e uma maior variedade dentro de sua estrutura devido ao seu instrumental mudar constantemente. Um exemplo disso são as guitarras que mudam pelo menos três vezes na música, sempre trazendo uma nova linha/passagem ou riff. Assim como "For Sure", também é uma música direta, mas com um instrumental muito mais técnico. Fazendo uma comparação, essa música me remete muito ao som que o This Town Needs Guns(ou TTNG, como quiserem) faria um bom tempo depois.

O que mais me chama atenção em "I'll See You When We're Not Both So Emotional" é a presença maior do baixo na mix (o que não tinha acontecido até então) e este fazendo junto da bateria um groove até mesmo dançante (depois deste turbilhão de frustração, solidão e despedidas, ainda da pra dançar?). Outro ponto interessante é a bateria, onde a influência jazz é ainda mais nítida e traz quiçá as levadas mais complicadas do disco inteiro.

Música mais longa do disco, "Stay Home" traz no título um ótimo conselho, não? A entrada das guitarras, preenchendo os espaços deixados por uma ou por outra, a "abertura" da bateria, onde no começo é possível somente ouvir um som seco e oco na mix que depois vai se tornando mais claro junto com o baixo. Aliado a tudo isso, aparecem versos curtos, mas que são suficientes pra te fazer refletir bastante sobre o que o título diz.

Acho que "The One With The Wurlitzer" é um final justo para o disco, já que nela aparecem todas as características apresentadas anteriormente em outras faixas. A música começa com um fade in trazendo primeiramente o wurlitzer em um tema principal e depois a presença da bateria, baixo, guitarras e um trompete na mix. À medida que a música anda, o wurlitzer segue seu tema, as guitarras se juntam aos poucos e a bateria leva tudo isso com o baixo, criando um clima de despedida e faz parecer que tem alguém te dizendo um “tchau, até breve” com um sorriso no rosto.

Onde escutar: https://www.youtube.com/watch?v=MqRNSwXQUwA aqui tem o re-lançamento do álbum em versão deluxe que a polyvinyl records fez ano passado que além das músicas originais, essa versão traz gravações velhas de ensaios da banda e uma música inédita, "The 7's".

Caso alguém ficou em curioso/curiosa sobre as outras bandas que surgiram após o fim do Cap'n Jazz, deixo aqui algumas recomendações.


11 junho, 2015

Psychic TV - A Pagan Day (1984)

Nota: 7,3






Eduardo Kapp




Pra um grupo que era basicamente pedaços que restaram da formação do Throbbing Gristle, eles conseguiram influenciar muita gente e inovar afu, considerando a época e tudo. Digo, não é todo dia que tu cruza por um trabalho de early-industrial-early-70's. Esses caras são um bocado complexos, a banda teve várias fases e várias lideranças e etc etc.

Pulando pra parte interessante: esse é um dos discos da fase inicial, onde o mastermind ainda era o Alex Fergusson. Um músico bastante underground, tocava tanto nesses grupos de acid house experimental quanto em coisas mais punk e tudo. Ele e o famigerado Genesis P-Orridge montaram e gravaram todo o álbum, praticamente. Tudo meio de garagem, num mero 4-track.

Foram feitas apenas 999 cópias da distribuição original do álbum. Tem uns tarados colecionadores que pagam alto simplesmente pela capa da edição original (o re-release tem uma outra capa). Definitivamente, é um lance muito mistério/nonsense que se formou em volta dessa banda e especificamente desse disco.

Embora hoje em dia tu escute isso e consiga fazer algumas relações ou comparações, imagino que na época tenha sido algo completamente único. As composições soam como uma mistura de alguém praticando as primeiras lições de um instrumento qualquer enquanto uma bateria eletrônica se adapta a mesma e alguém mais entendido vai fazendo a coisa efervescer.

"Cadaques" é exatamente isso. O fato é que mesmo sendo muito estranho de primeira, é aquela coisa que te deixa interessado. E do nada tu se vê num daqueles morros estilo o finalzinho do filme "Harold and Maude", numa tarde de terça, provavelmente reconhecendo a voz de alguém que tu não conhece passando por perto. Ao menos essa é a vibe de "We kiss", "Cold Steel". Soa como a Nico no "Chelsea Girl", só que mais lo-fi, eletrônico e dessa vez realmente afim de cantar.

Bastante coisa ambiente, intimidadora (eu ia falar agressiva-passiva mas eu não suporto essa expressão) e tudo. É aquela coisa que se tu conseguiu chegar numa zona de conforto ouvindo é porque tu caiu na nóia que eles tão propondo. Tem que se deixar levar.

O problema mora aí mesmo: se tu não conseguir se deixar levar. Começa a ficar um bocado irritante, dependendo do contexto que tu se coloca pra ouvir. Aí sim, eles parecem um bando de cretinos fazendo barulho. Acho que isso é a coisa mais interessante em artistas fora do eixo/padrões que nossos ouvidos tão acostumados, tu fica realmente intimidado com o negócio. É como tentar entender uma conversa entre estrangeiros (que tu não conhece a língua, obviamente).

Essa coisa é simplesmente um clássico da banda, que é uma baita influência pra cena early-industrial e eletrônica da época. É essencial.

Onde ouvir: https://www.youtube.com/watch?v=4id3GVWPYFE (não tem o álbum inteiro online :/)

06 junho, 2015

Apanhador Só @Theatro 13 de Maio


Se tem um coisa que acredito que dispense uma prévia discussão é que o (ou a, como preferir) Apanhador Só lançou em 2013 um baita disco, no caso, o "Antes que tu conte outra". Pois bem, a última aparição da banda por Santa Maria havia sido 3 anos atrás, na rua, em formato diferente do show plugado e com formação diferente. No Theatro, dividiam o espaço os 3 membros fixos e 2 "músicos de apoio", se é que se chama assim. Enfim... a espera pelo show era visivelmente grande. Até mesmo o Alexandre brincou: "estamos fazendo show de lançamento no encerramento da turnê (rsrs)".

Aos gritos e prantos de ansiedade, a casa lotada viu as cortinas se abrirem aos ruídos de Mordido, seguido de um bloco de canções do AQTCO. Curiosamente, o show parecia divido em blocos, quando surgiram alguns clássicos em sequência do primeiro álbum. Peixeiro, Prédio, etc. E aí depois tudo virou uma grande festa onde já não se havia mais critério entre álbuns e até o ep Paraquedas teve espaço com a música homônima e Salão de Festas. Em meio a uma reciprocidade muito avante, me chamou atenção as versões modificadas de algumas músicas pro show ao vivo, como variações de riffs e solos acrescidos, rolou isso com Maria Augusta e algumas outras das quais não me lembro o nome agora. 

Se a logística de um teatro já permite uma certa proximidade entra o artista e o expectador, a coisa toda se vale mais ainda quando os caras desplugam todos os intrumentos pra sentar à beira do palco pra cantar Na Ponta do Pés, uma legítima quebra de protocolo que pode ser conferida neste vídeo. Mas o grande catarse da noite e que pra mim tem sido um diferencial da Apanhador pra qualquer outra banda é a ideia de que o fã também é parte da banda. Foi quando se pediu voluntários pra subir no palco pra grande anarquia que estava por vir em Nado. Latifúndios de alegria nos rostos que ali seguravam entre outras coisas, panelas, colheres, brinquedinhos e o escambau. Quem ficou sentado ainda era intimado pra fazer barulho com o que tivesse em mãos, e dalí saíam trovões de molhos de chaves. Cacarejadas sem limites, situação periclitante, um semi-caos instituído.

Que todos mereciam uma acústica como a do Theatro isso nem se discute. O grande x da questão é que uma hora as cadeiras pareciam ter formigueiros, o que fez com que todos se levantassem em Maria Augusta, já na reta final. Maria Augusta e Nescafé foram tocadas a pedidos, que eu me lembre. Satisfação garantida após cerca de 1h20min de show e pedidos atendidos, a banda se despede esperando o bis, que não foi pedido dadas as circunstâncias já citadas, imagino eu. Volta o Fernão das cortinas e sopra um "galera, peçam mais uma". Aos gritos de "mais um" voltam os guris pra tocar Vila do Meio-dia e terminar o show.

foto: Luciéli Raminelli
Musicalmente o negócio saiu como se esperava. O que de algum modo me surpreendeu foi a energia que a banda estava, ainda levando em conta que os caras tinham instrumentos roubados horas antes do show. Harmonia pura, e detalhe: o baterista (que agora me foge o nome) exalava oceanos de simpatia ao tocar quase que todas as músicas sorrindo e dançando. Até mesmo as canções mais sombrias e sérias do AQTCO tinham brechas de felicidade. Eu que esperava caras fechadas como vi em muitos vídeos de apresentações da turnê. O próprio clipe de Mordido não me deixa mentir.

E foi isso. Após o recado de "nos encontrem na banquinha ali depois pra trocar uma ideia" a banda se despediu prometendo voltar num futuro não muito longe com a turnê Na Sala de Estar. Sem muita delonga: show que fez valer a pena perder a rodada do futebol de quarta à noite.

Matheus Donay

28 maio, 2015

Deerhunter - Halcyon Digest (2010)

Nota: 9,5







Nychollas Cardozo




Bem, venho aqui falar-vos sobre algo que considero não só um disco, mas uma bela e conceituada obra de arte. Preciso mencionar, obviamente, que sou suspeito em falar dessa banda, e principalmente desse trabalho em específico, mas não posso deixar de tecer as percepções e opiniões que tenho sobre ele. Falamos aqui de Halcyon Digest, o quinto álbum do conjunto, lançado em 2011 pela 4AD (a mesma gravadora de Ariel Pink, Animal Collective, entre outros).

O Deerhunter surgiu por meados de 2001, em Atlanta, Georgia; tendo como líder Bradford Cox, o cara alto, magricelo e estranho que infelizmente tem síndrome de Marfan. A banda se formou com a ideia de unir a “propulsão do rock de garagem” com a música ambiente, assim como já se auto descreveram “ambient punk”. Eles carregam uma enorme gama de influências, e Cox é o tipo de pessoa que vai até a loja de discos e ouve o que aparecer a sua frente, sabendo apreciar e absorver muita coisa.

Mas enfim, falando do álbum: ele se abre com “Earthquake”, uma das faixas mais experimentais do conjunto. Algo que flerta com a vanguarda pré-setentista do Velvet Underground, e invoca as experimentações ambiente feitas pelo Slowdive, em seu último disco, Pygmalion. A letra trata de uma personagem que acordou situada em um terremoto e é questionando sobre as coisas que poderiam estar passando pela sua cabeça naquele momento recém-desperto, em meio ao caos, ainda em processo de assimilação. O que pode explicar a lentidão cadenciada da música e o aspecto descritivo da cena. Com essa abertura, não se pode deixar de lado a produção e mixagem do disco, que englobam todo o restante. São muitas camadas encharcadas de efeitos, e se pudéssemos criar uma imagem sinestésica nesse aspecto, daria para imaginar um cenário assim: um dia húmido na serra gaúcha, aquele dia no qual a serração desce, atingindo os vidros dos carros e deixando-os foscos. Essas “camadas” sendo a linha tênue entre a água condensando em gotas nos vidros e a neblina, ainda pairando pelo ar gelado em meio às montanhas crepusculares. Tudo isso em um esquema de cores preto e branco, como mostrado em toda a arte do disco físico, além das fotos do encarte.

“Sailing” traz o lado mais folk à tona, a canção em si é só voz e guitarra, e mostra uma razão existencial, transparecendo isso do jeito mais confortável e inteligível possível, utilizando ruídos e efeitos que lembram algo como o vento batendo nas velas de um veleiro que flutua na calmaria marítima. Do mesmo modo que em “Fountains Stairs”, composição do guitarrista Lockett Pundt, a sensação é de que você está ouvindo o outono e a primavera ao pé do seu ouvido. Lembrando que o Deerhunter tem um pouco disso: letras de autoajuda, o que pode parecer meio idiota, mas na realidade nada mais é do que o diálogo do músico com o ouvinte sobre as dificuldades diárias e mundanas de qualquer pessoa. “Desire Lines” também retrata essa situação, e falaremos dela logo mais...
Um aspecto muito importante desse disco são as memórias: o quão ele puxa situações da infância e juventude. A faixa que mais evidencia isso é “Memory Boy”, que conta com takes de gaita e um arranjo de cordas bem destacado. Ela nos leva a um insight do “protagonista”, que de um verso para outro volta à infância/adolescência, onde se encontra em uma situação de mudança. Supõe-se que sua família estaria trocando de lar, o que é mostrado pela repetição de “It’s not a house anymore” ou “I see you leaving/Don’t forget your TV”. O narrador acaba retomando os bons tempos em que viveu naquele lugar, e termina por relatar que a mudança teve um impacto psicológico. Algo parecido ocorre em “Don’t Cry”, que transparece um diálogo de pai para filho em suas estrofes, ou pode ser que seja Bradford dando conselhos para si mesmo quando mais jovem.

“Desire Lines”, single do disco e também escrita por Pundt, tem em si aquela função da qual havia dito anteriormente, bem ressaltada no último verso: “Well, everyday do what you can/and if you let them turn you’round/whatever goes up must come down”. A composição trata sobre as dificuldades existentes entre a juventude e a vida adulta, representando as sensações que o indivíduo pode passar enfrentando a “vida real” e os caminhos que ela pode seguir. Há também a ideia de que as tais desire lines são aquelas estradas que se desviam do concreto e são formadas na terra pelo excesso de passagens, desenhando um caminho alternativo. O mais interessante dessa música é que após o fim do último verso e de sua estruturação normal, ela passa a se tornar um improviso. Sim, a boa e velha jam, repetitiva e repleta de efeitos, dando aquela vibe crua a garageira, apesar de refinada e bem produzida. Essa é a fatia de maior deleite da música e da banda também, os improvisos longos são característicos deles.

A excelente, e também single, “Helicopter” é uma das peças sonoras mais originais e palpáveis. Quando que algo tão experimental pode se tornar grudento (no bom sentido) e pop? Não há como explicar, mas é nessa música que Cox mostra sua genialidade, e também é onde aquela descrição da produção mais se encaixa. Os delays e reverbs dos acordes dedilhados parecem ricochetear às margens de um lago sereno e monótono. O refrão e os versos são os mais bem marcados, e a letra tem sua explicação nas entranhas do disco físico, que conta a história real de um ator pornô Russo que foi envolvido em tráfico humano. É interessante também o contraste criado com a bela e delicada canção e o tema trash tratado pela mesma.

Por fim, o álbum termina com a longa “He Would Have Laughed”. Também uma das mais belas composições presentes, e que de certa forma resume bem aquela ideia principal do disco: da nostalgia, da mudança, das memórias, tudo da vida que vai se tornando cada vez mais obscuro e termina com o bater das botas. Sim, é bem provável que Cox se refira a isso em seus versos.
Acho que não existem critérios para justificar minha nota ao álbum, ela simplesmente surgiu no momento em que pensei em fazer essa resenha. Acho uma nota justa, pois enxergo essa obra como algo único e original.

26 maio, 2015

Cícero - A Praia (2015)



Nota: 7,5






Fernanda Rodrigues





Depois de quase dois anos sem apresentar nada novo (quase o mesmo tempo entre o primeiro e o segundo álbum), Cícero finalmente volta, agora com o lançamento de A Praia. Um disco que, sinceramente, parece aquele irmão mais novo que quer imitar algumas coisas que o irmão mais velho fez e deu certo, bebendo às vezes da mesma fonte que o irmão do meio. Não que isso seja necessariamente algo ruim ou bom, é apenas um fato.

Para começar, a primeira faixa do álbum já é a continuação da última do segundo, Sábado, como o próprio nome “Frevo Por Acaso nº 2” já diz – realmente, se você for ouvir os dois discos um atrás do outro, parece que a mesma música voltou a tocar. Da mesma forma, “Cecília & a Máquina” retoma a personagem de “Cecília e os Balões”, só que agora incrementada com a voz de Luiza Mayall, mas sempre representando a pausa do álbum para um momento mais calmo e delicado. Não sei dizer exatamente o que Cícero pretendeu com esse último lançamento, mas na certa ele quis (re)elaborar o sucesso de Canções de Apartamento, apenas de um jeito um pouco menos nostálgico e melancólico.

É como se, antes do seu primeiro disco, Ciço tivesse levado um fora, se revoltado, chorado, sofrido, sentido saudade, achado que nunca mais ia superar aquele caso de amor que acabou, mas, de repente, assim do nada, encontrou alguém que tem tudo a ver com ele. Se antes, lá no início, com “Açúcar ou Adoçante?”, ele estava mais para “Entra pra ver/ Como você deixou o lugar/ E o tempo que levou pra arrumar aquela gaveta”, em “Terminal Alvorada”, tem um tempo que ele já não sabe o que é saudade. É como se ele tivesse se apaixonado e encontrado a pessoa certa, porque, embora as bases entre as músicas dos álbuns estejam parecidas, os versos estão mais felizes e amorosos, menos saudosistas e ressentidos. Novamente, é o cantor nos deixando saber um pouco da história da sua vida.

E por falar nisso, é bom lembrar que Cícero deixou sua carreira de advogado para tentar a sorte na música e parece que é isso que ele lembra logo de cara nos primeiros versos de “Frevo Por Acaso nº 2”: “Papeis, documentos/ Velhas formas de comportamento/ Na rotina de sol e cimento, amanhecemos”. No mesmo caminho, a gente percebe também o mesmo estilo de referência em “Soneto de Santa Cruz”, que carrega no título o nome do bairro em que o cantor cresceu. Cícero continua, claramente, apostando no que deu certo no seu primeiro álbum: compartilhar com os fãs sua rotina, sua vida, sua biografia.

Tudo bem, vocês podem estar pensando “tá mas o segundo álbum? E Sábado? Ele não se inspirou em nada?”. Olha, foi até bom que as influências do segundo disco não tenham ido fortes nesse terceiro, porque Sábado foi meio decepcionante para quem já conhecia o cantor do primeiro álbum. Ficou um som experimental demais, meio fraco, que foi forte alvo de críticas pela maior parte das pessoas que o vinham acompanhando. Claro que nós não sabemos se a intenção de Cícero não foi justamente fazer um álbum mais experimental, mas, ao que parece, se o objetivo realmente era esse, ele não alegrou muito a torcida.

Por isso que a gente vê muito mais de Canções de Apartamento em A Praia. As melhores músicas do álbum são aquelas que lembram as do primeiro disco, como “De Passagem” e “Camomila”, que apresentam os mesmo versos repetitivos empregados já em “Ponto Cego” anteriormente. O sentido da música continua prático, direto e objetivo, sem forçar muito o ouvinte a parar para pensar “bah, mas o que ele quis dizer aqui?”. E isso não é ruim. Muito pelo contrário, às vezes o que a gente mais quer é um álbum que seja direto e diga o que a gente quer ouvir mesmo, de uma maneira fácil e descontraída.


Em outras palavras, e já para finalizar, Cícero continua o mesmo (talvez até mais do que o necessário), mas isso significa também que a qualidade das músicas continua boa. Alegrou quem queria a volta daquela promessa do MPB que apareceu em 2011, ainda meio tímida, nos convidando para entrar em seu apartamento (dá uma olhadinha na review do primeiro álbum -> aqui), mas que agora já nos leva para um passeio na praia, mais feliz, menos triste com o coração, como se um verãozinho tivesse chegado para aquecer seus sentimentos. O bom e velho Ciço came back.