18 janeiro, 2016

Grizzly Bear - Veckatimest (2009)

Nota: 10







Eduardo Kapp




O Pop Barroco é aquele sonho estranho que persegue teu inconsciente, nunca te deixa lembrar do que aconteceu por inteiro, fica conversando com o maldito fantasma (ou vulto, não é algo realmente relevante) que a gente sempre acaba vendo de canto de olho quando tá sozinho no quarto ali pelas duas da manhã. Tu fica num estado de puro vazio e ao mesmo tempo debruçado por cima de todos os detalhes. Todos os detalhes.

Eu precisava dizer isso. Pra ser sincero, mesmo que enquanto eu escreva isso ainda tenha bastante sol e bastante dia, sei que é uma questão de tempo até que essa coisa toda volte a me assombrar. É terrível. Não, sério, me escuta, guarda esse pensamento todo que tu acabou de ter! Vou tentar ser mais direto. O ponto é que, como que eu vou ignorar todos esses pianos elétricos distoantes e todos esses vocais em coro tão bem colocados e raciocinados (logo quando até a Victoria Legrand participa dessa brincadeira toda)?

Mesmo em 2009, todo mundo que já tinha ouvido pelo menos alguns minutos de Grizzly Bear sabia da busca quase infecciosa pela perfeição, da variedade de instrumentos, dos sons que começam como meros ruídos de fundo e crescem até bizarras e deliciosamente enormes experiências? Quero dizer que, fora o álbum de estréia, eles já tinham lançado alguns EPs e o próprio (conhecido) Yellow House. Todos muito bons e interessantes (e tudo).

Eu vou falar de uma vez. Os cretinos conseguiram fazer seu próprio SMiLE. Um disco intrinsecamente pensado, completamente envolvido com si mesmo e ao mesmo tempo explodindo em conteúdo (muitíssimo relevante) pro mundo exterior. Não tem como não ficar hipnotizado pela quantidade de esforço (aparentemente) colocada em cada segundo de música aqui ouvida. Na abertura mesmo, "Southern Point" não tem o menor medo de mostrar que não estamos prontos pro que virá depois.

E aí tu se pergunta: "tanta meticulosidade não acaba sem vida?" E eu digo que não. Definitivamente não. Na verdade, poucas vezes tive tanta certeza de alguma coisa (sei que ao dizer isso acabei de assinar minha sentença de gente vindo me perturbar). É aquele caso em que, mesmo que o disco seja um bocado orientado pra cada música individualmente, ainda existe uma coesão absurda. Nenhuma faixa a mais nem a menos. Aí que chega a parte mais hipnótica do Pop Barroco: é Pop. Sim, um disco como esse, longe de ser parecido com o que domina o mainstream (ainda mais em 2009), tem pelo menos dois "hits". Não dá pra deixar de falar da "Two Weeks", que é praticamente (na ideia que deixei anteriormente) a "Good Vibrations" do álbum. Uma sinfonia de bolso. Os synths vibrando no fundo, imersos nos vocais! Ah, que maravilha. Bom, daí em diante tem um período de preparação e recuperação. Não de uma forma pretensiosa, mas incrivelmente lógica.

Acho que, de um jeito ou de outro, a melhor coisa mesmo desse álbum, é que a perfeição toda não é forçada. Dá pra sentir o lado da originalidade e ambição estando muito mais à frente do perfeccionismo, sendo um a ferramenta do outro e não o objetivo. É claro que eu não tenho como te garantir isso nem nada, mas é aquele tipo de coisa que tu vai ouvindo e a cada vez parece ainda melhor que a anterior. É realmente difícil de compreender facilmente, acho que quando algo é pretensioso não tem como ser muito fundo nem nada, aí os menores detalhes acabam escapando na primeira oportunidade.

Se você gosta de música como arte, se você gosta de arte como música ou até mesmo se você gosta de ficar confuso e ao mesmo tempo iluminado, esse um dos álbuns definitivos.

Onde ouvir:
https://www.youtube.com/watch?v=F5mGYiLSYiI&list=PL_JYBJZdlL5JKnuJLnjT70oLOkit_i56c

31 agosto, 2015

FKA Twigs - M3LL155X (2015)



Nota: 9,1






Fernanda Rodrigues






Sabe aqueles artistas que vão criando nome discretamente? Tu já ouviu o nome deles uma vez, no passado, aí escuta outra vez aqui e ali, vê como sugestão nos recomendados do Last.fm e quando vê PLAU o cara já se tornou uma das novas apostas do cenário musical do ano. Eu me sinto exatamente assim em relação a FKA Twigs. 

Nesse mês, quase exatamente um ano depois do lançamento de seu disco LP1, Twigs já aparece de novo com novidade, mas dessa vez com um EP curtinho de cinco faixas, M3LL155X (lê-se “Melissa”). É nada mais nada menos que mais uma de suas misturas de R&B com eletrônica e tri hop, vozes sussurrantes e feminismo (ainda que seja interessante observar como a voz dela se impõe melhor nesse álbum do que no anterior).

Desde LP1, twigs já deixou bem claro pra todo mundo que não tinha problemas em apresentar temas como sexualidade em suas músicas (aliás, já é uma espécie de característica marcada, querendo ou não). “Two Weeks”, em 2014, já havia traduzido isso muito bem com trechos como “Smoke on your skin to get those pretty eyes rolling/ My thighs are apart for when you're ready to breathe in/ Suck me up, I'm healing for the shit you're dealing”. Apesar de estarmos em pleno século XXI, vale lembrar que falar sobre sexo, especialmente entre mulheres, ainda é um certo tabu (cantar então, ainda mais quando não é através do hip hop ou rap, como faz a Nicki Minaj ou, na maioria das vezes, os homens, é ultrajante). Por isso que twigs é um grande expoente do feminismo musical.

Em M3LL155X, “I’m your doll” é a faixa feminista da vez, tratando tanto do abuso como da objetificação do corpo da mulher, com um vídeo mostrando justamente twigs como uma boneca inflável e com um homem representando o amante agressivo. Apenas o fato de ela já retratar esse tipo de situação em uma música é tipo “ei pessoal, ok. Objetificação feminina existe, certo? Precisamos falar sobre isso sem medo”. É uma das músicas que, junto com “In Time”, tem mais apelo pra um mainstream comercial também, embora FKA Twigs ainda seja uma artista pouco tocada e conhecida na grande mídia.

Além disso, é importante considerar que M3LL155X contou com uma produção em parceria com BOOTS, o mesmo cara que produziu o último álbum autointitulado da Beyoncé. Até dá pra ver nesse EP da twigs algumas semelhanças com “Flawless” e “7/11”, mas nada (absolutamente nada) que a tenha transformado em uma mais uma cópia barata de mais uma diva do pop. Assim como Azealia Banks e Janelle Monáe, twigs tem criado um espaço único pra ela dentro da música. Pra falar a verdade, ela até mesmo tem um pouco da pegada sci-fi que a gente já viu em Monáe (dá uma lida na resenha de The ArchAndroid aqui), mas twigs não perde sua originalidade porque se diferencia com batidas desconexas e quebradas na maioria das músicas, com um ritmo que acelera e diminui a velocidade na mesma proporção quando menos se espera. Acredito que justamente por ser um pop não óbvio e instrospectivo, twigs tenha permanecido (e resistido) por tanto tempo fora do mainstream.

Seja como for, Tahliah Bebrett Barnett, Forerly Know As Twigs (ela teve que adotar esse nome por causa do outro Twigs que já existe na música), através de M3LL155X, deu um tapa na cara da sociedade que ainda a reconhece apenas como a >>namorada do Robert Pattinson<<. Ela não vai ser mais uma mulher que se limita a viver à sombra do cara que anda com ela, twigs é bem mais que isso, o que já deixou bem claro com a personagem Melissa que criou para o álbum. Como ela demonstrou no vídeo contínuo ( praticamente um curta-metragem de pouco mais de 16 minutos com quatro das cinco músicas do álbum) com "In Time" seguida de "Glass and Patron", quando aparece grávida e "dá à luz" a tintas e panos coloridos, twigs é dona da própria criatividade e libertação, sem precisar do empurrãozinho de ninguém pra atingir o sucesso. Ela representa a independência e o esforço que, através das suas músicas, também quer ver nas mulheres que a acompanham.



Onde ouvir: https://www.youtube.com/watch?v=bYU3j-22360

30 agosto, 2015

Beach House - Depression Cherry (2015)

Nota: 6,0







Eduardo Kapp




"Fall back into place"

Porque será que o disco vazou tão cedo? Aliás, porque demorou tanto pra lançar? 3 anos depois do aclamado "Bloom", a dupla eco-reverberada finalmente aparece com um novo álbum. Beach House, pra quem não sabe, é um dos primeiros nomes que surgem no imaginário popular quando se pensa em dream pop atual. Simples, melódico, flutuante e sempre imersivo é o som deles, desde o início, praticamente.

Digo, teve o "Teen Dream" lo-fi e tudo, depois o "Devotion" já foi mais adiante e era mais uma experiência de vida do que qualquer outra coisa. Basicamente, eles (Victoria Legrand e Alex Scally) encontraram um campo de som perfeito (pra eles), sempre naqueles tons dreamy e tudo. Tá, foi genial no início, mas foram poucos os momentos que tentaram sair dessa zona de conforto. O "Bloom" só deu certo por isso: inovaram.

Mas aqui não. Muito pelo contrário. Se tu pedir pra alguém descrever genericamente o som deles os adjetivos vão com toda certeza combinar com o som desse disco. Até nas entrevistas a banda diz que resolveu ficar de boas e só fazer o que fazem normalmente e isso já era o bastante. Bom, o som genérico deles é legal, mas até que ponto isso te mantém ligado pelos seus 40 minutos de duração?

"Sparks" é tão boa, tão genial, tão intensa. Eu só consigo pensar nessa música quando penso nesse álbum. É tipo, Sparks e o resto. Todas as outras são lado-B se comparadas. Foi o primeiro e obviamente o single que lidera a promoção do disco. Combina não só os clássicos sons deles como uma pegada bem shoegaze. Algo como Slowdive meets Cocteau Twins. Definitivamente uma das melhores coisas que eles fizeram até então. Pulsante, bem produzida, tudo no lugar. As coisas vão acontecendo e aí fica tudo escuro e tu não sabe onde tá. Como uma faísca, só que ao contrário.

Não dá pra deixar de falar de "Space Song" ou "Levitation", que por um belo acaso estão logo antes e logo depois de "Sparks". Também algumas das melhores coisas que a banda fez em tempos. Lembra bastante o Teen Dream, na real. Ao menos, ficam na cabeça, são interessantes e tudo. Eis o grande problema: além desses sons, não lembro de nada do resto.

Longe de ser ruim ou algo assim, só que é completamente descartável. Tu fica perdido e se perguntando se a próxima música vai ser melhor. Mais um disco em vão. Não sei ao certo, mas pelo título acho que todo mundo esperava mais. Prefiro pensar no "Depression Cherry" como 3 grandes singles e alguns lado-B bons(inhos), afinal é isso que me faz querer ouvir outra vez.

Thiago Ramil - Leve Embora (2015)

Matheus Donay












Não sabia que Thiago, da árvore genealógica mais musical do Brasil (família Ramil), lançaria um álbum até ver pelas webs um link com o seu primeiro single. Esperei o álbum com um pouco de ansiedade, apesar de desconhecer a carreira dele. Um sentido instintivo até.

Desde a gestação do disco, fantasiei como este poderia ser. Sei lá, um caderninho de inquietações e/ou pensamentos aleatórios do compositor, gosto de intimismo quando não se torna ego. Quando isso rola, parece que se a gente largar o disco físico numa balança ela mal vai reagir, tamanha leveza. Algo que você sente em todos detalhes: a lomografia da capa, o nome das músicas, o encarte, enfim.

Leve também, a voz de Thiago me passa uma mistura de maturidade/juventude.Voz: um instrumento muito importante neste disco, que deixa vácuos em alguns momentos e mira todos feixes de luz pra salientar somente a ela. O single Desculpa foi a primeira demonstração, onde apenas alguns ruídos do baixo acompanham o vocal. Aliás, é nessa música que ele reservaria seu lugar no inferno se estivéssemos na idade média, tamanho ceticismo na letra.

O disco é moderno em vários aspectos. Um deles, é a relativa facilidade de se gravar um debut álbum numa qualidade padrão de produção. Seja por financiamento ou edital (o caso deste), as portas têm sido abertas com pequenos ventos. Outra coisa que notifiquei, que pode ser impressão minha ou não, é que raramente um artista tem lançado disco solo sem alguma parceria. E as parcerias costumam fazer as melhores músicas. Em Leite e Nata, um ping-pong de voz masculina/feminina (me escapa o nome de quem canta, perdona-me) cantam uma letra cheia de trocadilhos e de uma poética interessante.

No geral, o violão é quem mais dá a cara a tapa no disco. Entre uma música e outra você ouve algum violino, uma variedade de intrumentos de percussão, ares de MPB e em Dizharmonia uma samplezinha de Strawberry Fields Forever (daquele famoso quarteto inglês) que te pega despreparado.

O Rio Grande do Sul nos últimos anos tem sido um polo de formação de artisas jovens e independentes. Uma safra que aumenta a oferta pra uma demanda infinita que é a de gente pra ouvir. Nesse meio, Leve Embora é um disco pra ouvir com as janelas abertas com o sol rachando em alguma delas. Às vezes a estética do ambiente influencia nas canções. Tá dado o recado.

09 agosto, 2015

Júpiter Maçã @Theatro Treze de Maio

Foto: Ana Bittencourt / Rádio On The Rocks
Na última semana matutava quase que diariamente com alguns amigos sobre qual Júpiter veríamos na nossa frente neste show. Seria aquele pulsante e elétrico ou aquele com as pilhas fracas e mórbido? Dentre as várias facetas que já conhecíamos, o fato é que a espera pra ver ele foi muito grande. 

As cortinas se abriram e Júpiter tocava durante o show uma verdadeira salada mista no que tange as épocas de sua carreia. O novo, o já nem tão recente, o velho e o velho remodelado. Quando falo em novo me refiro à promessa de novo álbum que já se especula e que tudo leva a crer que terá uma roupagem mais folk. Se tiver curiosidade, procure por 'Constantine Empire', que leva a melodia de uma música sua que nunca foi gravada oficialmente: Doenças de Alma. 

Modern Kid, Um lugar do caralho, As tortas e as cucas, Beatle George...Todas presentes no set. Quanto à escolha do repertório não há muito o que se questionar, talvez pudesse se reivindicar algo como a Marchinha Psicótica ou Miss Lexotan, que ficaram de fora.

Mas o grande ponto da noite - infelizmente - não foram os clássicos da renomada carreira de Flávio Basso. Foi quando eu e meus amigos descobrimos qual Júpiter faria a apresentação que pairou sobre o teatro uma energia de desconfiança e lamento. Visivelmente debilitado pelo álcool, o cara via na sua frente (quando não virava de costas pro público) espectadores que com certeza tinham enorme carinho, respeito e admiração por tudo o que a sua carreira já havia proporcionado.

Foto: Atílio Alencar


"Quem compra ticket para Jupiter Apple, compra ticket para um filme de terror!" Frase expressa pelo próprio.

Por vezes o show se tranformava em comédia stand-up, momentos em que ele assumia o microfone para tornar público seus contos eróticos e coisas pornográficas non-sense. Longe de qualquer moralismo, mas o uso de palavrões fora de contexto foi demasiado e não faltaram expressões e discursos que imprimissem opressão às mulheres. Júpiter Maçã mais parecia uma criança cheia de hormônios e mal educada. Apesar de tudo, recebia aplausos meio constrangidos e risadas que justificam o "rir pra não chorar".

O show, que pontualmente começou às 20 horas, teve um repertório de 13 músicas e duração de 1h e 30min. A justificativa pra um show tão demorado pro número de músicas em questão se dá pela imprevisibilidade do Júpiter, que fazia com que uma música de 4 minutos durasse 8. Errava os tempos de começar a cantar, esquecia letras, não tinha noção de espaço apesar do palco grande e até mesmo o cabo da sua guitarra era uma armadilha, já que se enrolava a todo momento. A banda, que não deixava a peteca cair, chegava a ficar minutos tocando à espera de que Flávio Basso resolvesse cantar, o que - convenhamos - cansa.

Por tudo que aconteceu, não há como não deixar uma menção honrosa à banda que acompanhava o músico e aos dois roadies. Era um show que não dava brecha pra distração. Os olhos de todos eram voltados para o man, que dava muito trabalho, chegando a sumir do palco por vários minutos. Aí, triste/brilhantemente o sintetizador assume a voz que nos deixou órfão naquele tempo de espera pra cantar artificialmente as sílabas de Essência Interior. Ainda acho que o ambiente contribuía pra frustração. Pois ora, se tem duas coisas que repudio assiduamente assistir sentado, elas são: jogo de futebol e show de rock. O teatro não é o habitat natural do Júpiter Maçã.

Depois do show, conversando sobre as impressões, é unânime o sentimento amargo. Obviamente, é um momento nobre e raro ver ao vivo canções tão clássicas como as que eram apresentadas, mas aquela coceira na cabeça, a pulga atrás da orelha, essa não tinha como evitar. 

Lembro-me de ter ficado meio triste no início do ano, quando anunciaram que Júpiter estava se despedindo dos palcos com dois shows acústicos em Porto Alegre, dos quais não poderia ir. Depois da apresentação de ontem, fico pensando se não teria sido melhor para o próprio Júpiter ter tirado um tempo pra si ficando longe dos palcos. A obra dele está lá registrada, intocável, ninguém apaga a história muito menos desconstrói o que significa o Júpiter e sua importância na música gaúcha/brasileira. Só que o que foi visto foi melancólico, jamais havia sentido algo ruim ao sair de um show. 

É como entrar num carro com o motorista embriagado e torcer pra que não ocorra nenhuma fatalidade no percurso e chegue em casa bem. Aonde foi parar aquele menino que queria cantar como o beatle George? Júpiter precisa de ajuda, pra ontem - literalmente.

Matheus Donay 

17 julho, 2015

Pedro Pastoriz - 1 (2015)







Matheus Donay






Geralmente quando paro pra ouvir um álbum do início ao fim passam muitos pensamentos pela cabeça. Obviamente, a maioria deles pré-moldados, ainda não lapidados e muitas vezes precipitados. Tive uma sensação boa-estranha ao ouvir o "1", disco do Pedro Pastoriz. Fui com uma boa expectativa, impulsionado pela banda que ele faz parte, o Mustache & Os Apaches.

Gosto das culturas regionais e como elas estampam bem ‘seu território’ nos acordes, letras e na pura essência. Por outro lado, acho muito interessante quando alguém que não é do habitat abraça um gênero longínquo. Acho que o brasileiro Pastoriz tirou de letra interpretar o folk raiz americano, um pouco diferente daquele folk mais pop do Mustache. Aliás, muita gente brasileira conhece o folk, mas desconheço artistas do ramo (se alguém souber, por favor, me indique).

Para os apreciadores do futebol: sabe quando tu começa a lembrar/imaginar os velhos cabeludos de chuteira preta e bigode? Pois é. Esse é o feeling do 1. Gravado em 1 TAKE em FUCKING 40 MINUTOS, direto no vinil. Romantismo puro. Reza a lenda que o cara TIROU O CABAÇO do Brasil nesse tipo de gravação. A grosso modo, já imaginou deixar teu celular captando som, pegar um violão e uma gaita e gravar um disco? Mahomenos isso que rolou.

Ainda essa semana conversava com o outro rapaz que escreve neste blog sobre alguns folks dos anos 40s, os métodos gravação e a vibe toda do cenário. Curiosamente na mesma semana sai esse álbum, com características muito marcadas da época. Desde o simplório instrumental, o jeito de cantar e a qualidade do som. Nesse vídeo dá pra sacar o quão roots é a coisa, https://vimeo.com/125068399. Um disco que sinceramente poderia se chamar “Ao vivo no estúdio”.

A gravação crua desse tipo nos permite apreciar as minúcias que só a simplicidade nos oferece, longe de qualquer trabalho de mixagem, efeitos, pedais e toda essa parafernalha. Tipo quando o cara resolve aumentar a voz e vazam uns ecos ambientes. Rola isso bastante em Figurantes do Showbizz. Ou então em Sheik, onde rolam aqueles barulhos de quem bate no microfone ou coisa do tipo.

O cara falou que vai sair tocar na rua, cafés, brechós e onde seja que role um espacinho. A começar pela Europa. Parece que rola toda uma estética em volta, com cenário e tals. As letras, que foram escritas nos States, também entram nessa. Uma roupagem clássica do folk.

Sinceridade é o ponto forte do trabalho. As letras, as palhetadas, o take NUDE. Raras as vezes em que senti proximidade com o artista, mesmo que seja um sentimento abstrato. Se a intenção era tocar o ouvinte por este viés, acho que o cara teve êxito.

Onde ouvir: https://soundcloud.com/pedropastoriz/sets/pedro-pastoriz-1

16 julho, 2015

Tame Impala - Currents (2015)

Nota: 6,5







Eduardo Kapp





Meu indicativo de popularidade absurda de uma banda é quando o som deles chega, de alguma forma, aos ouvidos da minha mãe (eu sei que tu não tem tempo de ouvir mais músicas e tudo, não se ofenda ok mãe). Pois então. Ela, assim como vocês, conhece e aprecia o hit-single-psych-pop-bliss "Feels Like We Only Go Backwards". Essa música, parte do também enorme e absurdamente bom "Lonerism" levou o Tame Impala aos headlines de vários festivais importantes. Literalmente, eles passaram os últimos 3 anos em tour contínua, sempre nos maiores e melhores lugares.

No início underground, fizeram o nome com seu som meio garage-stoner-psych rock ("Tame Impala EP"), evoluindo pra algo mais atmosférico e espacial no primeiro full-lenght "Innerspeaker". Até aí, era um "revival-moderno" que tinha um público alvo mais limitado e tudo. Se o Kevin continuasse só com isso, já teria um lugar garantido tanto na crítica quanto nos circuitos de shows.

Só que: ele seguiu mudando. Em 2012 é lançado o segundo LP, "Lonerism". Genial, popular, inovador. Realmente colocou o Tame Impala no topo. Gerou uma porção de bandas nessa mesma direção, rendeu um pesadelo pra vários grupos que "soam como Tame Impala". Bom, desde 2012 Kevin foi lentamente alterando seu estilo, fazendo algumas jams mais eletrônicas e menos trabalhos centrados na guitarra.

Aí que começa essa aproximação cada vez mais pop. Na verdade, o próprio Lonerism, embora não "pareça", é supostamente inspirado em coisas como.. Britney Spears. Entre isso e aquilo, Kevin postou uma porção de covers (desde Michael Jackson até OutKast) e rolou um EP com o Flaming Lips, um tocando as músicas do outro.

As entrevistas só repetiam isso: "Kevin diz estar ouvindo mais pop" "Kevin não consegue mais controlar a vontade de fazer pop" etc etc. Pra coroar, veio a participação no "Uptown Special", do Mark Ronson. E pra deixar bem claro: nada disso foi ruim. Muito pelo contrário. Fui ficando cada vez mais fascinado pela ideia de um futuro disco super-edgy-pop-psicodélico. Quem sabe íamos nos deparar com o próximo Pet Sounds? Foi por essa época que o "Currents" finalmente teve uma data mais ou menos prevista pra lançamento. O hype já tava crescendo exponencialmente.

"Let It Happen": a odisseia pulsante entre loops e viradas de knob, sintetizadores gigantescos, analógicos, a pista que todos os fãs precisavam pra colocar ainda mais fé nesse disco. O mesmo vale pras outras faixas que foram lançadas pela mesma época. "Eventually", "Disciples" e "'Cause I'm A Man". Todas apontavam pra uma mesma direção: disco, groovy-funk, pop (e quiçá umas gotas de vaporwave). No início fiquei meio assim, não parecia ser ~tudo isso~, meio abaixo do potencial esperado e tal. De qualquer forma, "Eventually" e "Let It Happen" acabaram melhorando muito depois de alguns dias, são definitivamente algumas das melhores músicas feitas por Parker até então.

Quando finalmente consegui ouvir o disco, fiquei todo errado. "Nangs", que tinha aparecido como trilha pra um vídeo-prévia do disco tava lá como música. Qual é. 1 minuto e 48 segundos da música que praticamente todo mundo ficou querendo mais. Depois passar os primeiros 30 segundos achando que eu tinha colocado "Everyone Wants To Rule The World" do Tears for Fears pra tocar, quando na verdade era a faixa 3 "The Moment". Não foi algo exatamente agradável.

Mas fora isso, a primeira metade do disco é quase impecável. "Yes I'm Changing" diz muito sobre as intenções do Kevin no disco, que praticamente tenta mudar a visão sobre álbuns "de rock". Como ele disse, tenta convencer prog-70s-heads que dá pra unir o som deles com alguns synths dos anos 80. A produção tá muito melhor. No duro, a confusão sonora de algumas coisas dos discos anteriores não passa nem perto. O perfeccionismo nas layers chegou a níveis inimagináveis. Tá tudo no lugar, certinho, cuidadosamente pensado. A temática toda das letras é meio break-up songs. Deve ter algo a ver com o fim do relacionamento com a Melody Prochet (da Melody's Echo Chamber). Mas isso de uma forma bem 80's, não tão "abstrata" e aérea quanto nos discos anteriores. "[..] and gazing out the window, as I ascend into the sky" em 2010 agora é "[..]she was holding hands with Trevor, not the greatest feeling ever" (ok eu sei que foi uma comparação meio nonsense mas deu pra sacar o ponto)

O problema, no entanto, não é a mudança do estilo, mas o disco como um conjunto. Enquanto tem essas baladas-espaciais-melancólicas geniais, ou esses sons mais pulsantes e explosivos, tem umas músicas completamente desnecessárias só pra tomar espaço. Os vocais em algumas músicas parecem vazios e sem muita vontade. Parece que, em algum ponto da história toda, o Kevin se transformou numa mera máquina de fazer músicas. Acho que ele vê seu "Eu" produtor separado do Eu artista. Bizarro.

Tem essa "Past Life", com uma voz grave e modificada, mais te deixando desconfortável e confuso do que "intrigado". Aí no single "'Cause I'm A Man" é a mesma coisa óbvia e previsível a música toda. Depois daí, sinceramente, eu só consigo lembrar daquela linha "does it really fucking matter?" em "Love/Paranoia" (que mesmo assim só falta alguém chegar e falar "d-d-drop the bass" pra completar a brincadeira). As outras, nem fazem falta ou te deixam afim de ouvir de novo.

Ou seja, tem essas músicas geniais, o Kevin tá tomando riscos, não tá na zona de conforto, é a melhor direção que se pode tomar artisticamente: seguir se desafiando e tudo. Isso nos mostra que o Tame Impala é ainda maior, se reinventando e explorando. Mas aparentemente ele não conseguiu tornar isso agradável no todo, acabando com uma coisa meio repetitiva, fraca e previsível. Vale muito até a metade (com ressalvas), depois é uma combinação de tristeza e tédio.

Onde ouvir: https://www.youtube.com/watch?v=gq_qFBJkOI4